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Manifestantes invadem embaixada de Israel no Cairo

15/09/2011

 “El Pais” 10-09-2011

Tradução: Fred Henriques

O embaixador de Israel no Egito, Yitzhak Levanon, deixou o país com sua família e parte da missão diplomática depois da noite em que centenas de egípcios ocuparam a embaixada de Israel no Cairo, a atacaram, derrubaram o muro que a protege e entraram no edifício que ela está sediada. Após uma manifestação em protesto a lentidão das mudanças democráticas da Junta Militar que passou a dirigir o país após a queda em fevereiro da ditadura de Hosni Mubarak, centenas de manifestantes se dirigiram a embaixada israelense, derrubaram o muro que a cerca, e mesmo com a presença policial entraram no edifício. Os choques posteriores com a polícia e o exército deixaram três mortos, um por ataque cardíaco, quase mil feridos e pelo menos 28 detidos.

Diante dos acidentes, um gabinete de crises egípcio se reuniu e depois da reunião o Ministro do Interior declarou estado de alerta e cancelou todas as férias de policiais por todo o país. A crise diplomática entre Israel e Egito tem empurrado o presidente dos EUA, Barack Obama, a expressar sua preocupação e pedir ao governo egípcio que garanta a segurança da embaixada israelense. O primeiro ministro de Israel, Benjamín Netanyahu, qualificou o assalto como “incidente sério que poderia ter sido pior caso os agitadores houvessem conseguido atravessar a última porta e ter ferido a nossa gente”.

O ataque e os tumultos subseqüentes eclodiram quando centenas de manifestantes atacaram a embaixada israelense localizada num dos últimos pisos de um edifício residencial de 21 andares. Primeiro armados com martelos e barras de metal conseguiram derrubar um muro de 2,5 metros de altura, construído ainda esta semana diante de algumas manifestações anti-israelenses. Depois, trinta deles ocuparam o edifício, e lançaram milhares de documentos pelas janelas. Inicialmente, eles disseram que eram oficiais, mas Israel sustenta que foram papéis da entrada. Os manifestantes vieram de um grande protesto da Praça Tahrir, onde reclamavam das novas autoridades mais velocidade nas tímidas reformas democráticas e uma maior depuração dos ex-alto cargos da época de Mubarak.

Durante as primeiras horas do ataque a polícia se limitou a conter os manifestantes, mas não impediu que eles derrubassem o muro. Com vista aos fatos o ministro da defesa de Israel, Ehud Barak, anunciou que havia pedido ajuda aos Estados Unidos para proteger a sua embaixada. Depois disto, a ação da polícia passou a ser mais contundente. Uns 2000 manifestantes atearam fogo em diversos veículos ao redor do edifício e os distúrbios causaram cerca de 500 feridos. Os manifestantes também atacaram uma delegacia nas intermediações, mas foram afastados com gás lacrimogêneo, apesar de terem conseguido queimar 4 carros policiais. O exército fixou tanques ao redor da embaixada e a polícia acabou por usar gases e tanques de água para dispersar aquela zona. No entanto, ao amanhecer umas 500 pessoas ainda estavam presentes nos arredores, embora os agentes tivessem conseguido isolar as proximidades do edifício diplomático.

O primeiro ministro, Essam Sharaf, convocou um gabinete de crise para fazer frente aos novos incidentes e a crise diplomática com Israel.

Desconfiança em direção aos militares

 Os protestos começaram ontem, sexta-feira, um dia de oração e de protesto desde a eclosão da revolta que derrubou Mubarak na Praça Tahrir, onde milhares de pessoas participaram de uma marcha exigindo acelerar as reformas políticas e o fim dos julgamentos civis em tribunais militares. O descontentamento e desconfiança progressiva junto à junta militar que dirige a transição democrática vem alimentando as marchas de protesto que se repetem desde a queda de Hosni Mubarak, em fevereiro. Uma das palavras de ordem mais repetidas na manifestação diante da embaixada foi “o povo quer a queda do Marechal”, referindo-se ao chefe do Conselho Militar, Hussein Tantawi, a mais alta autoridade no país desde a queda de Mubarak.

O ataque à embaixada agrava a crise diplomática que se anunciava desde a queda de Mubarak em fevereiro. Com o ditador, Israel tinha um aliado do outro lado da fronteira desde a assinatura de um acordo de paz em 1979, mas sua queda e a chegada de novas autoridades deixaram os pactos no ar. Os novos governantes militares garantiram que eles iriam respeitar estes, até porque esses acordos garantiam ao Egito uma grande ajuda militar dos norte-americanos. No entanto, também tem que lidar com o descontentamento do povo egípcio, que não simpatiza com Israel e seus abusos sobre os palestinos. O delicado equilíbrio foi quebrado abruptamente em Agosto passado, quando cinco soldados israelenses mataram cinco guardas de fronteira egípcios numa operação para capturar milicianos palestinos, um incidente que levou Cairo a chamar seu embaixador em Israel e exigir um pedido de desculpas oficiais, algo não ter ocorrido.

Dado o que aconteceu, Obama telefonou para o premiê israelense, Benjamin Netanyahu para expressar seu apoio e sua “preocupação”, chamando também o Egito a “cumprir suas obrigações internacionais” e proteger a missão diplomática israelense.

Os novos passos da primavera egípcia

15/06/2011
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Por Frederico Henriques, sociólogo e militante do PSOL/SP, esteve 12 dias no Egito durante as manifestações de março de 2011.

Apesar da insistência da mídia em tirar de foco os avanços das revoluções democráticas no Oriente Médio e os seus reflexos na Europa, levantes e contradições se acentuam no último período. Estes fatos podem ser vistos no aprofundamento da revolução democrática tunisiana, com a assembléia constituinte, na juventude e nos trabalhadores da Síria, que continuam a onda de protestos por todo o país, e mesmo no Egito, que começa a dar uma nova dinâmica para a geopolítica regional.

Embora no Egito o referendo constitucional de março tenha consolidado uma grande vitória de setores reformistas sobre os setores radicalizados no processo, fazendo com que a revolução caminhe de forma mais lenta que o caso tunisiano, a Primavera Egípcia começa a dar seus primeiros grandes passos após a queda de Mubarak.

Na geopolítica internacional, o Egito passa ater uma posição mais independente do imperialismo europeu e norte americano, que pode ser vista na abertura do Canal de Suez para navios persas, especialmente iranianos. Porém, o passo mais importante foi na mediação Palestina, pois após a revolução de 25 de Janeiro vários setores palestinos passam a ver o Egito como um mediador importante de sua causa. Essa movimentação faz com que o grupo dirigente da Faixa de Gaza, Hamas e o principal partido da Cisjordânia, Fatah, iniciem um processo de acordo, especialmente com o aumento das manifestações massivas em suas regiões pedindo a união destas duas facções. A assinatura de reaproximação destes dois grupos foi feita no Cairo, demonstrando a importância da independência egípcia para a vitória da causa Palestina. A solidariedade pela libertação deste povo foi gritada por centenas de milhares de egípcios no dia 15 de Maio.

 Internamente no país as contradições e embates também prosseguem. Semanalmente a Praça Tahrir continua a ser ocupada por manifestantes, sempre com a pauta da punição a Mubarak e seus comparsas. A dificuldade em avançar na pauta política dificultou a unificação dos grupos de juventude, especialmente porque a pauta das eleições do segundo semestre passaram a tomar conta da pauta política. Enquanto os setores conservadores, ligados a antigos aliados e partidos de Mubarak, articulam a candidatura de Amr Moussa à presidência do Egito, ElBaradei se postula como porta voz da revolução e se aproxima dos principais grupos de juventude.

O grande avanço no processo revolucionário está acontecendo no seio da classe trabalhadora. Apesar dela não ter anunciado a primavera, é exatamente este setor que se tornou o mais dinâmico e mantém paralisações e greves de maneira constante desde o início do processo, além de reivindicações por melhores condições de trabalho e o aumento do salário mínimo de 70 para 200 dólares, como exemplos de algumas pautas mais concretas. Porém, foi no 1º de Maio deste ano, com dezenas de milhares de jovens e trabalhadores nas ruas, que se pode dar um salto qualitativo com a criação de uma Central Sindical Independente, algo nunca alcançado pelos trabalhadores deste país.

Apesar da falta de organizações políticas que tenham capacidade de acelerar este processo, a revolução democrática não pára. Dificuldades e superações estão no centro do país mais populoso do mundo árabe.

 

Ventos da revolução na Islândia.

15/06/2011

Por: Atilo Boron em 10/06/2011

Tradução: Antonio Antunes da Cunha Neto. Geógrafo, membro do Diretório Nacional do PSOL.

Aproximadamente no ano 2000, o governo conservador da Islândia impulsionou um radical programa de reestruturação econômica neoliberal, dando inicio à abertura comercial indiscriminada e ao amplo e acelerado processo de privatizações e desregulamentações. No setor financeiro, isto foi particularmente acentuado: os três principais bancos da Islândia, o Glitnir, o Landsbanki e o Kaupthing, até então pequenas entidades públicas (considerando que a população do país é cerca de 330.000 habitantes), foram privatizados. A legislação regulatória das finanças e dos bancos foi flexibilizada. As auditorias governamentais sobre o sistema financeiro foram consideravelmente subvalorizadas.

Tal como o afirma o narrador do excelente documentário Inside Job, o ocorrido na Islândia o “mais puro experimento jamais ensaiado em matéria de desregulamentação financeira.”.

Inseriu esses três pequenos bancos, que nunca haviam operado fora da Islândia, na dinâmica especulativa do cassino financeiro mundial. Obtiveram empréstimos – endividando-se, naturalmente – por um montante de 120 bilhões de dólares, uma cifra quase dez vezes superior ao PIB islandês. O resultado foi a formação de uma gigantesca bolha, que inflou os preços das ações dez vezes acima de seu valor anterior, enquanto os imóveis aumentavam quase o triplo. Coerentes com este tipo de operação, os bancos aconselhavam seus clientes a transferir seus depósitos aos novos instrumentos bursáteis agora disponíveis, para beneficiar-se do auge dos negócios especulativos, com investimentos realizados naquelas regiões do capitalismo globalizado onde houve melhores perspectivas de rentabilidade.

Todo este disparate se levou a cabo sem provocar a menor inquietação das autoridades reguladoras islandesas. Não só isso: uma das três maiores empresas de auditoria contábil do mundo, a estadunidense KPMG (que emprega a 138.000 profissionais para atender seus negócios em mais de 150 países) auditou aos bancos islandeses e seus investimentos, sem que seus sagazes e experts detectassem a menor irregularidade em suas operações, em que pese o exorbitante endividamento, que não só superava os ativos dos bancos senão várias vezes o produto interno bruto da ilha.

Porém ainda, tão tardiamente como em fevereiro de 2007, as qualificadoras de crédito Norte-Americanas lhes outorgaram, já abertamente envolvidos em operações especulativas a escala global, a máxima qualificação possível: AAA. Uma vez mais se confirma que todo o entremeado de instituições financeiras globais, começando pelo FMI e Banco Mundial, e seguindo com os bancos de investimentos, as qualificações de crédito, e as consultorias e auditorias internacionais, amparadas pelas diversas agências reguladoras nacionais, não são outra coisa que uma sinistra conspiração, mediante a qual um grupo de ladrões e estafadores a serviço do capital – absolutamente imorais e dispostos a cometer qualquer crime – planejam, organizam e executam o despojo dos trabalhadores em escala mundial.

          Interessado em colher as lições que se derivam do caso islandês, em janeiro deste ano, a pagina web WWW.nosimibici.com publicava uma nota sem assinatura na qual saudava os acontecimentos que estavam tendo lugar naquela ilha e fazia uma prolixa enumeração dos fatos principais ocorridos desde o momento em que se produziu um desmoronamento da economia islandesa. A crônica incluía os seguintes itens, alguns dos quais ampliamos agregando novos antecedentes:

  • No final de 2008, os efeitos da crise são devastadores. Em outubro se nacionaliza Landsbanki, principal banco do país. O governo britânico congela todos os ativos de sua subsidiária IceSave, com 300.000 clientes locais e entidade públicas do Reino Unido. Seguiram ao Landsbanki os outros bancos principais, o Kaupthing o Glitnir. Seus principais clientes estão nesse país e na Holanda, clientes aos quais os governos destes dois países têm que reembolsar um montante de 3,7 bilhões de euros apelando a fundos públicos.  A esta altura dos acontecimentos, o conjunto das dívidas bancárias da Islândia equivalia a dez vezes seu PIB. Por outro lado, a moeda se desvaloriza e a bolsa suspende suas atividades sob uma desvalorização de 76%. O país entra em bancarrota.
  • O governo solicita ajuda ao fundo monetário internacional, que aprova um empréstimo de 2,1 bilhões de dólares, completado por outros 2,5 bilhões que aportam alguns países nórdicos. 
  • Os protestos sociais em frente ao parlamento em Reykjavik vão aumentando. Dia 23 de janeiro de 2009, são convocadas eleições antecipadas e, três dias depois, os “caçarolaços” e os protestos desencadeiam a demissão do primeiro ministro, o conservador Geir H. Haarden e de todo seu gabinete.
  • No dia 25 de abril, realizam-se eleições gerais das quais emerge um governo de coalizão formado pela aliança Social-Democrata e o Movimento de Esquerda Verde, encabeçado pela nova Primeira Ministra Jóhanna Sigurdardóttir.
  • Ao longo de 2009 continua a péssima situação econômica do país e o ano fecha com uma queda de 7% no PIB.
  • Mediante uma lei amplamente discutida no parlamento, que propõe a devolução da dívida à Grã Bretanha e à Holanda, mediante o pagamento de 3 bilhões de euros, soma que deveriam pagar todas as famílias islandesas mensalmente durante os próximos 15 anos a 5,5% de juros, as pessoas voltaram às ruas e solicitaram submeter a lei a um referendo. Em um gesto sem precedentes, em janeiro de 2010, o presidente, Ólafur Ragnar Grímsson, se nega a promulgá-la e anuncia que chamará uma consulta popular. Tal como recorda em uma reportagem o jornalista islandês Kristinn R. Ólafsson, correspondente na Espanha da Rádio Nacional da Islândia, Grimsson é um ex-político comunista que já está a 14 anos como presidente da República. Esta situação foi a que originou a convocatória do referendo, para que os islandeses decidissem sobre a aprovação do acordo. A consulta popular foi em março de 2010 e o acordo IceSave acabou rechaçado por 90% dos votantes.
  • Em represália, o FMI congela as ajudas econômicas à Islândia, esperando que se resolva favoravelmente a devolução de sua dívida.
  • Em relação a tudo isso, o governo iniciou uma investigação para dirimir juridicamente as responsabilidades da crise, começando as detenções de vários banqueiros e altos executivos. A Interpol expede uma ordem internacional de prisão contra o ex-presidente do Kaupthing, segurdur Einarsson. Segundo o já mencionado Ólafsson, há cerca de 160 denunciados e alguns se encontram em prisão preventiva.
  • Neste contexto de crise, se elegeu uma assembléia constituinte no mês de novembro passado para redigir uma nova constituição, que recolha as lições aprendidas com a crise e que substitua a atual. Para isso, se recorreu diretamente ao povo. Foram eleitos 25 cidadãos sem filiação política, dos 522 que apresentaram candidaturas. A Assembléia Constitucional deveria ter iniciado seus trabalhos em fevereiro de 2011.
  • Após as eleições, das quais participaram somente 36,7% dos eleitores, três dos candidatos que não foram eleitos, denunciaram irregularidades na votação. O Tribunal Supremo, a mais alta instância judicial islandesa, com maioria de juízes conservadores, os quais haviam sido nomeados pelo governo anterior, decidiu que a votação era nula por estas irregularidades. A solução para esta situação será dada pelo parlamento, que nomeará estes 25 eleitos, porém agora não como membro de um parlamento constituinte, senão de um conselho constituinte.
  • E para terminar, outra medida “revolucionária” do parlamento islandês: a iniciativa islandesa moderna para meios de comunicação, um projeto de lei que pretende criar um marco jurídico destinado a proteção da liberdade de informação e de jornalismo. Pretende-se fazer do país, um refugio seguro para o jornalismo de investigação e a liberdade de informação onde se protejam fontes, jornalistas e provedores de internet que alojem informações jornalísticas. Em suma, o inferno para EEUU e o paraíso para Wikileaks.
  • Por último, em abril deste ano, foi convocado um novo referendum para resolver a questão da divida com o Reino Unido e Holanda, centrado nas operações de IceSave. Em que pese a intensa campanha do governo para que a população aceitasse o pagamento da divida algo mais que 60% da população manteve sua negativa e, portanto, a resposta oficial foi rechaçada.

Como bem anotam os companheiros de nosinmibici, a história da revolta islandesa pode ser resumida assim: sublevação popular, derrocamento de um governo conservador, nacionalização dos bancos, referendo para que o povo decida sobre as decisões econômicas transcendentais, processo e eventual prisão dos responsáveis pela crise, reforma da constituição pelos cidadãos e um projeto de blindagem da liberdade de informação e de expressão.

E fica a questão: houve alguma notícia sobre isso nos meios de comunicação europeus? Algo foi dito a respeito nos repugnantes círculos de comentaristas políticos e mercenários da desinformação? Vimos imagens dos fatos pela TV? Claro que não! O temor, o pânico, é o contagio. Por isso a revolução islandesa, ainda que talvez se possa objetar o uso daquele termo, deu um exemplo, um mal exemplo, que deve ser silenciado, calado, ignorado. E a “imprensa livre”, na Europa e em todo o mundo, ocultou maliciosamente o ocorrido. Porém será em vão. Pois nos últimos dias se fala que, na Grécia, o encurralado governo irá convocar um referendo popular para decidir se aceitam ou não as condições do “salvamento” imposto pelo FMI e seu títere europeu, o Banco Central Europeu.

A brava luta do povo grego e sete ou oito greves gerais acabaram com a reticência oficial. Não passará muito tempo antes que outros povos exijam o mesmo. Espanha parece haver recorrido o testemunho islandês ao denunciar a falsa democracia que oprime, explora e marginaliza a grande maioria de sua própria população. Uma escandalosa plutocracia, na realidade, não uma democracia. Estamos vivendo um tempo novo e a revolução, que parecia senão definitivamente descartada, pelo menos mais distante do que antes, parece hoje, mais próxima que nunca. A história, uma vez mais, fez picadinho de todos os esquemas.

Crise Européia e despertar de um novo tempo: a resistência massiva contra ajustes do FMI

05/06/2011

Boletim n° 6 – junho/2011

Nesse Boletim especial, a Secretaria de Relações Internacionais do PSOL apresenta análises e propostas sobre a crise econômica e política da União Européia. O projeto do Euro dá sinais de fracasso total. Os países altamente endividados, como Grécia, Espanha, Portugal, Irtlanda, Itália, atravessam uma situação ironicamente semelhante à história latino-americana, subordinados aos planos de auteridade do FMI. Os níveis de desemprego batem recordes. Os governos, responsáveis pela crise, estão dispostos a repassar a conta para o povo, e aplicar os ajustes com dedicação exemplar. Os ajustes, contudo, são o oxigênio da crise, são o aprofundamento da supremacia financeira sobre os direitos do povo. Porém há um fato novo,  que dá sinais de novo tempo: as revoluções democráticas árabes inspiram os jovens europeus a tomar as ruas para resistir. Apresentam nas praças da Espanha um novo programa para governar o país, com democracia real, controle popular das contas públicas, garantia dos direitos sociais. Apresentam nos plebiscitos populares da Islândia a decisão implacável de punir os banqueiros pela crise. A crise da União Européia é um momento da crise econômica internacional iniciada em 2008. É, portanto, uma crise  estrutural, e sua solução só pode ser radical. Do contrário, será o adiamento da mesma crise, que eclodirá mais forte no futuro. Sobre este tema, há artigos de Paul Krugman, Carlos Taibo, Pedro Fuentes, Israel Dutra, Partido Obrero Revolucionario da Espanha, do El País, além do programa eleitoral do Bloco de Esquerda de Portugal, e a plataforma Democracia Real Ya, o mais novo movimento social de massas espanhol, com tonalidade internacionalista.

 

Apresentamos também uma notícia necessária: a vitória do povo hondurenho que, em sua batalha democrática, conquistou a volta de Manuel Zelaya a Honduras, com garantias de direitos civis e políticos. Esse fato atesta a fraqueza do imperialismo estadunidense, muito preocupado com as revoluções árabes para intervir em defesa do truculento governo Porfírio Lobo, momentaneamente desamparado.

 Boa Leitura! 

Crise burguesa e despertar político na Europa

 Por Pedro Fuentes, Secretário de Relações Internacionais do PSOL

 Dois processos de signo oposto compõem a situação política da Europa. De um lado há uma quebra do projeto econômico e político construído pelas classes dominantes na União Européia (UE). Basta ler os jornais para perceber como o otimismo que reinou nas duas primeiras décadas de existência da EU (os anos 80 e 90), deu passos em direção ao ceticismo cada vez maior sobre o presente e o futuro incertos. Os fatos mais preocupantes são o estancamento econômico global e a crise aguda de alguns de seus países-membro. De outro lado, um despertar do movimento de massas. Contagiados pela revolução árabe, os jovens espanhóis tomaram as ruas e praças com um novo movimento político, que em certo sentido nos lembra o Maio francês. ……LEIA MAIS

 

Maio Espanhol: às portas de um novo tempo? 

Por Israel Dutra, sociólogo e membro da direção nacional do PSOL

 A velocidade das notícias, no atual período turbulento que vive o planeta, se multiplica.

A morte de Bin Laden e a prisão de Strauss-Kahn trouxeram à tona mais incertezas no complexo cenário mundial. Contudo, um elemento novo, surpreendeu a todos. A irrupção do movimento de “indignados” em Madrid acelerou ainda mais a história. Seguido por quase 200 manifestações em todo o território espanhol, mobilizou centenas de milhares de pessoas no país. O “15-M”[alusivo a data da primeira manifestação] rompeu a apatia do calendário eleitoral espanhol. Em pleno 2011, temos um novo Maio na Europa. A juventude e o movimento dos “indignados” estão construindo uma ponte com as revoluções do mundo árabe e a luta do povo da Islândia contra os bancos e a crise. ……LEIA MAIS

  

Quando a austeridade fracassa

 Por Paul Krugman, The New York Times

Se os bancos gregos entrarem em colapso, isso obrigará o país a sair da zona do euro, o que daria início à queda dos dominós financeiros em grande parte da Europa. Muitas vezes eu me queixo, e com razão, sobre o estado em que encontra a discussão da economia nos EUA. E a irresponsabilidade de alguns políticos – como esses republicanos que afirmam que um calote da dívida americana não seria um grande problema – é assustadora. Mas pelo menos entre os membros do “grupo da dor, defensor do rigor “, para quem elevar as taxas de juro e cortar as despesas do governo diante do desemprego em massa de alguma maneira deixarão as coisas melhores, não piores, estão sendo obrigados a um certo recuo por parte do Federal Reserve e o governo Obama. ……LEIA MAIS

 

 Palavras de 15 de Maio

 Por Carlos Taibo, professor da Universidade Autónoma de Madrid

 Chamam-no democracia e não o é. As principais instituições e, com elas, os principais partidos conseguiram demonstrar a sua capacidade para funcionar à margem do ruído molesto que emite a população. Os dois partidos mais importantes, em singular, cenificam desde tempo atrás uma confrontação aparentemente severa que esconde uma fundamental comunidade de ideias. Um e outro mantêm nas suas fileiras, falando nisso, pessoas de mais que duvidosa moralidade. Não é difícil adivinhar o que há por trás: nos factos são formidáveis corporações económico-financeiras as que ditam a maioria das regras do jogo. ……LEIA MAIS

 

 Uma praça Tahir na Europa?

 Por Pedro Fuentes, secretário de Relações Internacionais do PSOL

  Indignados. Fartos. Dezenas de milhares de pessoas se manifestaram, dia 15 de maio – último domingo – em mais de 50 cidades espanholas. A manifestação foi convocada sob a plataforma cidadã “Democracia Real Já!”. A concentração de maior envergadura ocorreu em Madri, onde milhares de pessoas conseguiram parar o centro da cidade. “As críticas aos políticos, partidos e banqueiros, ao resgate das entidades financeiras, ao trabalho precário, aos cortes nos gastos sociais, e à atual lei eleitoral eram os lemas estampados nos cartazes”.“Violência é cobrar 600 euros” dizia um cartaz.“Não é uma crise, é um roubo.” lia-se num cartaz carregado por muitos manifestantes. ……LEIA MAIS

 

 

As praças exigem mudanças sociais, as urnas refletem um giro à direita

Por Partido Obrero Revolucionario da España (POR)

Dois processos estão misturados nas eleições de maio: a mobilização de milhares de jovens indignados com a crise econômica e com a falta de futuro que a atual sociedade lhes oferece e o voto em urna no dia 22. O resultado de ambos é bastante contraditório. Milhares de jovens ocuparam as praças de muitas cidades desde o domingo, 15 de maio. Com seus protestos não fizeram mais que expressar o sentimento geral no país: que a crise está sendo paga pela classe trabalhadora, que os banqueiros e os grandes empresários seguem acumulando benefícios; que os dirigentes políticos são incapazes de tomar medidas contra os mais ricos. ……LEIA MAIS

 

As praças são de esquerda

Comunicado do Partido Obrero Revolucionario da España  (POR)

O movimento 15 M é a expressão de uma rebelião crítica e cidadã da juventude engajada na denúncia e na resistência à crise capitalista e àqueles que a provocaram: os poderosos do setor financeiro e seus instrumentos políticos. Essa eclosão era necessária. O POR apoia e participa mobilizações nas praças nessa jornada eleitoral. Sol, com a participação das massas, é a ponta de um iceberg que emerge também na Catalunha, Donostia etc. A indignação e a frustração de uma juventude sem futuro, desacreditada do Eldorado capitalista, irrompe como novo fator político que ninguém poderá desconhecer após os atos de maio. ……LEIA MAIS

Islândia: o povo puniu a festança dos banqueiros

 Extratos de artigos do “El País”  

  A Islândia foi saqueada por não mais de 20 ou 30 indivíduos. Uma dúzia de banqueiros, alguns poucos empresários e um punhado de políticos formaram um grupo selvagem que levou a país inteiro à ruína: 10 dos 63 parlamentares islandeses, incluídos dois líderes do partido que governou quase ininterruptamente desde 1944, tinham empréstimos pessoais concedidos por um valor de quase 10 milhões de euros por cabeça. Ainda estão por comprovar que essa prática seja crime (ao que tudo indica, parte desse dinheiro era usado para comprar ações dos próprios bancos para inflar as cotações). Mas de qualquer maneira, sendo crime ou não, é um grande escândalo. ……LEIA MAIS

 

 Propostas do Movimento Democracia Real Já!

 Em democraciarealya.es

 1. Eliminação dos privilégios da classe política:

Controle estrito do absenteísmo dos cargos eleitos em seus respectivos postos. Sanções Específicas pelo abandono de funções.Supressão dos privilégios no pagamento de impostos, anos de contribuição e montante das pensões. Equiparação do salário dos representantes eleitos ao salário médio espanhol mais os honorários indispensáveis para o exercício de suas funções.Eliminação da imunidade associada ao cargo.Aplicabilidade dos delitos de corrupção.Publicação obrigatória do patrimônio de todos os cargos públicos.Redução dos cargos de livre designação. ……LEIA MAIS

 

Bloco de Esquerda de Portugal apresenta programa para superar crise econômica

Leia a plataforma eleitoral do Bloco de Esquerda de Portugal, para superar a crise econômica com auditoria da dívida pública, com ampliação emergencial do emprego, com valorização do trabalhador e dos direitos sociais, sem submissão aos planos austeros do FMI. http://www.esquerda.net/sites/default/files/compromisso_eleitoral_0.pdf

 

 A volta de Zelaya

Por Pedro Fuentes, Secretário de Relações Internacionais do PSOL 

 

O povo da Honduras explodiu de alegria e entusiasmo. Esse povo tem construído a mais ampla resistência contra um golpe militar em nosso continente e criou como sua ferramenta política a Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP), a organização de massas com maior dinamismo da América Latina atualmente. A FNRP recebeu a notícia do retorno de Zelaya com uma grande manifestação. Pela primeira vez em nosso continente, um acordo (de Cartagena) foi construído graças à mediação de Chávez e sem nenhuma intervenção do governo dos Estados Unidos. Isto mostra certa fragilidade da ação imperialista na região, pelo fato de os Estados Unidos terem que concentrar sua intervenção política no mundo árabe. .…..LEIA MAIS

Islândia: o povo puniu a festança dos banqueiros

05/06/2011

Extratos de artigos do “El País”

A Islândia foi saqueada por não mais de 20 ou 30 indivíduos. Uma dúzia de banqueiros, alguns poucos empresários e um punhado de políticos formaram um grupo selvagem que levou a país inteiro à ruína: 10 dos 63 parlamentares islandeses, incluídos dois líderes do partido que governou quase ininterruptamente desde 1944, tinham empréstimos pessoais concedidos por um valor de quase 10 milhões de euros por cabeça. Ainda estão por comprovar que essa prática seja crime (ao que tudo indica, parte desse dinheiro era usado para comprar ações dos próprios bancos para inflar as cotações). Mas de qualquer maneira, sendo crime ou não, é um grande escândalo.

Mas a festa desmoronou: os ativos dos bancos chegaram a um valor 12 vezes maior que o PIB do pais. Índice tão alto de multiplicação havia sido observado apenas na Irlanda – outro exemplo de modelo liberal. Da noite para o dia, com o anúncio da falência do Lehman Brothers e a quebra financeira mundial, o sistema desabou. Foi “o choque mais brutal e fulminante da crise internacional”, assegura Jon Danielsson, da London School of Economics.

A inflação disparou, o desemprego cresceu a toda velocidade, o PIB caiu 15%, os bancos perderam 100 bilhões de dólares. E de quem foi a culpa? Dos bancos e dos banqueiros, de sua desumana ganância. Os bancos são os vilões e têm toda a culpa da catástrofe que atingiu a Islândia. Em todo o caso, a culpa é também dos políticos que permitiram que tudo isso acontecesse.

Mas há algo que salva os islandeses e, de alguma maneira, lhes redime de parte desses pecados. Stephane Hessel conta que, na Europa e nos EUA, os financistas, culpados indiscutíveis da crise, salvaram-se e prosseguem sua vida como sempre. Em troca, suas vítimas não recuperaram o nível de ganhos, nem seus empregos. “O poder do dinheiro nunca tinha sido tão grande, insolente, egoísta com todos”, acusa. Entretanto, houve um país onde o povo não deixou que isso ocorresse “No país do ártico, o povo indignado obrigou os banqueiros a assumirem a responsabilidade.”Resolveram deixar quebrar os bancos e dizer aos credores que não eles não vão lhes cobrar tudo o que lhes deviam. Isso ajudou ajudou a mitigar algumas das consequências das loucuras de seus banqueiros”

 A crise deixou uma cicatriz enorme que segue bem visível. Esse processo elevou a dívida pública a mais de 100% do PIB e para controlar o déficit fiscal, tampouco os islandeses se livraram da onda de austeridade que percorre a Europa do Estreito de Gibraltar até a costa da Groenlândia: mais impostos e menos gasto público. Além disso, Islândia teve que pedir um empréstimo ao FMI, que obrigou a aplicar sua receita habitual: elevar os impostos e cortar gastos públicos. Com isso, houve corte de salários e benefícios sociais. Em alguns lugares, o governo chega a fechar escolas. Houve o enxugamento, enfim, do Estado de Bem-Estar.

 

Em referendo, Islândia rechaça pagar pelos erros de seus bancos

O NÃO vence no referendo que pretendia aprovar a indenização de 4 bilhões de euros que exigem Reino Unido e Holanda pela quebra de uma entidade bancária. O que você faria se um dos grandes bancos em seu país quebrasse e o Governo britânico exigisse um pagamento de 50.000 euros por família para saldar essa dívida? A Islândia, que já negou-se em uma ocasião a pagar essa fatura, enfrentou, no dia 09 de abril desse ano, um segundo referendum sobre “devolver” ou não os 4 bilhões de euros a Reino Unido e Holanda pela bancarrota de uma de suas entidades financeiras. E tornaram a dizer não. Segundo os resultados parciais, com 70% das cédulas apuradas,  57,7% dos votantes rechaçaram fazê-lo, frente aos 42,3% que o aprovaram. O resultado pode ser visto como um triunfo da denominada “Revolução do Panelaço”. 

O referendo foi convocado há dois meses pelo presidente islandês, Oláfur Ragnar Grímsson, que negou- se a assinar uma lei do Parlamento que estipulava as condições do acordo: um pagamento com interesses de 3% a 37 anos. Grímsson já o fez em outro momento: em dezembro de 2009 já forçou uma consulta similar, quando, contra todo prognóstico, se negou a assinar uma lei que obrigava a pagar com interesses de 5,5% em 15 anos. O NÃO ganhou, então, de forma esmagadora. “As antigas condições de pagamento eram muito injustas: as novas são melhores, mas se os islandeses vão ter que carregar uma dívida de seus bancos, devem ter direito de decidir. A Islândia é uma democracia, não um sistema financeiro”, declarou Grímsson.

O Governo, em troca, defendia o SIM no referendo, defendendo que os ativos do banco quebrado, quando se liquidarem, permitirão pagar a maior parte da dívida. Os partidários do NÃO argumentavam que o povo não deveria pagar pelas loucuras de seus bancos e que a legislação internacional -cheia de sombras- não obriga nenhum país a assumir dívidas astronômicas que ultrapassam  importância acumulada nos recursos de garantia.

O trunfo do NÃO deixa em uma difícil posição o Governo de coalizão entre social-democratas e  os “rojiverdes”, e complica o acesso da Islândia à União Europeia e aos créditos com o FMI e outros países nórdicos. Os islandeses sabem disso, e mesmo assim votaram NÃO. “Temos a opção de acabar com este desafortunado assunto com dignidade, ou  embarcar novamente num período de incertezas”, alertou à época o ministro das Finanças, Steingrimur Sigfusson. “De acordo: mas a crise já está sendo o suficientemente dura. Não quero pagar mais”, respondeu o diretor de cinema Arni Sveinsson.

Decepção Britânica

A reação do Reino Unido foi a esperada. O secretário-chefe do Tesouro britânico, Danny Alexander, expressou sua decepção ante a negativa dos islandeses em pagar pelo colapso dos bancos “É claro que o rechaço declarado pelo povo islandês ao que era um acordo negociado foi decepcionante. Mas é evidente que respeitamos sua decisão, mas agora vamos falar com nossos sócios internacionais e parece que esse processo irá terminar nos tribunais”.

Bloco de Esquerda de Portugal apresenta programa para superar crise econômica

05/06/2011

 Leia a plataforma eleitoral do Bloco de Esquerda de Portugal, para superar a crise econômica com auditoria da dívida pública, com ampliação emergencial do emprego, com valorização do trabalhador e dos direitos sociais, sem submissão aos planos austeros do FMI.

http://www.esquerda.net/sites/default/files/compromisso_eleitoral_0.pdf

A volta de Zelaya

05/06/2011
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Por Pedro Fuentes, Secretário de Relações Internacionais do PSOL 

 O povo da Honduras explodiu de alegria e entusiasmo. Esse povo tem construído a mais ampla resistência contra um golpe militar em nosso continente e criou como sua ferramenta política a Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP), a organização de massas com maior dinamismo da América Latina atualmente. A FNRP recebeu a notícia do retorno de Zelaya com uma grande manifestação. 

Carlos Aznares, no Resumen Latinoamericano,  relatou: “Milhares e milhares de homens, mulheres e meninos na rua, enfrentando aos militares e policiais, pondo o corpo às balas e também deixando nessa dura batalha dezenas de mortos, esta vez chegaram a Tegucigalpa de todos os pontos do país para se reencontrar com seu líder. Honduras se tingiu do vermelho da bandeira da Frente Nacional de Resistência Popular, e do azul da insígnia pátria, enquanto as ordens de ‘Sim, podemos’ e ‘Fora o imperialismo’ mesclavam-se com as vaias contra o governo do Porfirio Lobo”,

Nós do PSOL, através da Secretaria de Relações Internacionais, temos participado e colaborado com a FNRP e encontrado seus dirigentes, entre eles com Juan Barahona e Gilberto Rios. Não podemos deixar de saudar este triunfo da resistência hondurenha que é também de todos os latino-americanos. A volta da Zelaya era a primeira grande consigna da resistência e isso foi votado na grande Assembléia Nacional realizada alguns meses atrás. Essa conquista expressa um recuo objetivo do regime resultante do golpe de 2009. A recuperação dos direitos democráticos para o Mel (como é conhecido Manuel Zelaya) é um primeiro avanço das causas populares. Com isso, se obteve um grande fôlego para seguir a luta democrática e fortalecer a FNRP enquanto alternativa concreta de poder. É um passo crucial para conquista de um novo governo popular democrático, que tenha como base a FNRP. Essa tarefa está associada à defesa de uma Assembléia Constituinte que aponte para uma profunda reorganização do país, sobre outras bases políticas, econômicas e sociais.

A força alcançada pela FNRP é o que tem viabilizado o acordo da Cartagena. Nesse acordo participaram a FNRP, o governo de Lobo e o governo de Hugo Chávez. A FNRP afirma que segue sua luta pela Assembléia Constituinte e a restauração de todos os direitos democráticos e a punição aos golpistas. Com a volta da Zelaya, a FNRP e o povo de Honduras estão em melhores condições para alcançar seus objetivos.

Pela primeira vez em nosso continente, um acordo (de Cartagena) foi construído graças à mediação de Chávez e sem nenhuma intervenção do governo dos Estados Unidos. Isto mostra certa fragilidade da ação imperialista na região, pelo fato de os Estados Unidos terem que concentrar sua intervenção política no mundo árabe.

Certamente, é no Magreb e no Afeganistão que Obama foca sua ação. É nesta região onde revoluções democráticas derrubaram ditadores aliados dos governo estadunidense no sustento ao Estado sionista de Israel. É ali o lugar estratégico, onde o imperialismo vai evitar perder terreno e influência política. A situação mais desfavorável e a maior dor de cabeça estadunidense estão ali.  

No mesmo momento em que ocorre a volta da Zelaya com seus direitos garantidos, o governo do Egito abre as fronteiras com a Faixa Gaza e o Fatah e o Hamas voltam a se unificar na Palestina.

Com este acordo, a direção da FNRP deu uma prova de que tem capacidade de negociar com os inimigos em um momento que a correlação de forças não permite derrotar ao governo de modo contundente, e ao mesmo tempo sustenta as bandeiras fundamentais e a organização da resistência. Negociar foi a opção para obter passos parciais que facilitem melhores condições para fortalecer a FNRP e o movimento de massas. Não há dúvidas que a volta da Zelaya cria melhores condições para lutar pela queda do regime resultante do golpe de Estado e pelo avanço da luta de classes na América Latina a partir de Honduras.

Maio Espanhol: às portas de um novo tempo?

05/06/2011

 Por Israel Dutra, sociólogo e membro da direção nacional do PSOL

 

“Eles não nos deixam sonhar, não os deixaremos dormir”

  

A velocidade das notícias, no atual período turbulento que vive o planeta, se multiplica.

A morte de Bin Laden e a prisão de Strauss-Kahn trouxeram à tona mais incertezas no complexo cenário mundial. Contudo, um elemento novo, surpreendeu a todos. A irrupção do movimento de “indignados” em Madrid acelerou ainda mais a história. Seguido por quase 200 manifestações em todo o território espanhol, mobilizou centenas de milhares de pessoas no país. O “15-M”[alusivo a data da primeira manifestação] rompeu a apatia do calendário eleitoral espanhol. Em pleno 2011, temos um novo Maio na Europa. A juventude e o movimento dos “indignados” estão construindo uma ponte com as revoluções do mundo árabe e a luta do povo da Islândia contra os bancos e a crise. Foram manifestações que tomaram as praças centrais de Barcelona, Valencia, Granada, Sevilha, organizando acampamentos permanentes, com decisões assembleístas, atividades diárias, intervenções artísticas. Mesmo proibidos, centenas de milhares de pessoas, no dia da eleições[22 de março] desafiaram o Supremo Tribunal e tomaram as ruas de todo o país. Uma semana em que a Espanha respirou sua nova primavera política.

A mobilização da “Puerta del Sol”[1] trouxe, como bem afirmou Pedro Fuentes, a praça Tahrir para o coração da Europa.

 

A geração # : à rasca, sem futuro e indignada

As bases fundamentais para a mobilização da Puerta del Sol que se alastrou por toda Espanha combinam dois elementos: os efeitos cada vez mais duros da crise econômica e a marginalização política, efeito do regime controlados por uma partidocracia. A juventude que se expressa nas praças tem constantemente recebido o “não” como resposta. Não há vagas, não há lugar para intervir politicamente,não há moradia digna, não há educação de qualidade, não há possibilidades, não há futuro. A elite social e política espanhola, controlada pelo bipartidarismo a serviço dos bancos fez “ouvidos moucos” durante muito tempo. Agora o barulho é ensurdecedor.

 A relação que existe com os processos de mobilização recente do mundo árabe é direta. Não apenas pela eficácia das convocações que, burlando os mecanismos “oficiais”, ocorreram via as redes sociais e formas de comunicação alternativa. A identidade é bem maior. Nas praças da Espanha se podia ouvir referencias tanto a Praça Tahrir quanto a Islândia[país que aprovou o não pagamento de dívida com bancos em dois referendos populares]. Solidários na precarização, solidário na luta. Como referência aos islandeses, que protestaram por um ano durante todos os sábados, os manifestantes cantavam: “Espanha em pé, uma Islândia é”.

Segundo dados oficiais, a Espanha atravessa uma condição histórica de desemprego: ultrapassa os 20%, chegando a quase metade da população quando considerados apenas os estratos mais jovens. Os cortes no orçamento atingem em cheio os serviços públicos essenciais. As execuções hipotecárias deixaram quase meio milhão de pessoas sem teto nos últimos anos. Apenas em 2009/2010 foram 270 mil espanhóis que perderam suas casas.

A juventude da Europa está no seu limite enquanto projeto de futuro. Há uma terrível curva descendente na escala da mobilidade social. Os filhos e netos não terão condições de competir no mercado e manter o nível de vida das gerações anteriores. A face portuguesa deste movimento se manifestou da mesma forma, espontânea e radicalizada, na manifestação do último 12 de março. Convocada por meios alternativos como o Facebook, a manifestação reuniu a juventude que se autodenomina “Geração à rasca” [alusão a condição precária da juventude portuguesa]. O 12-M foi a maior manifestação deste país desde a Revolução dos Cravos. Os protestos renderam ampla repercussão, precipitando a queda de Sócrates. A juventude tomou a cena em Portugal. O escritor Mia Couto analisou da seguinte forma:

“Eis agora uma geração jovem altamente qualificada, que andou muito por escolas e universidades mas que estudou pouco e que aprendeu e sabe na proporção do que estudou. Uma geração que coleciona diplomas com que o país lhes alimenta o ego insuflado, mas que são uma ilusão, pois correspondem a pouco conhecimento teórico e a duvidosa capacidade operacional.”

A nova geração, diplomada e sem perspectiva, conhece violenta e dramaticamente a política. À sua exclusão, social, cultural e econômica responde com uma saída coletiva e indignada. A juventude “Indignada” como seus pares da “Geração à Rasca” e mesmo os “diplomados” da Tunísia são produto direto da crise estrutural do capitalismo.

 

Nem socialdemocratas, nem conservadores

O movimento “Democracia Real”[ nome da articulação que organizou a convocatória do 15-M] inverte a lógica fria do regime democrático liberal.

 Na Espanha, como em Portugal e na Grécia, quem aplica as medidas de austeridade é o Partido Socialista. Foi na gestão de Zapatero, ícone do social-liberalismo que se deram os cortes mais brutais. Para se ter ideia, o governo reduziu 15 bilhões dos gastos do orçamento público.

Além do controle exercido pelo Bipartidarismo na esfera dos postos executivos e legislativos, as organizações sociais e sindicais também são parte da crítica. As duas maiores centrais sindicais são espaços burocráticos e sem representatividade[UGT, CCOO]. No ano passado, o governo impôs o aumento da idade para a aposentadoria- a partir da nova lei, o mínimo será de 67 anos. Também foram privatizados setores como aeroportos e loterias. Tudo em nome da “austeridade fiscal”. As entidades sindicais não estabeleceram nenhum plano coerente de lutas. Pressionados pela base, por uma série de greves radicalizadas- como do metrô de Madrid- as direções convocaram uma greve geral em 29 de setembro de 2010. Apesar da condução morna e das atividades dispersas, a greve não foi “protocolar”. Grandes jornadas mostraram a disposição de luta dos trabalhadores, dos serviços, das funções públicas e da indústria. Uma vez mais, as centrais apresentaram seu caráter nefasto, não encaminharam nenhuma nova luta ou paralisação, acabando por aceitar a proposta do governo como um “mal menor”. Todos passos foram dados sem consultar as bases sindicais. O legítimo “pacto de cúpula”.

A irrupção da juventude, seguida por muitos trabalhadores, aposentados e setores da socidade civil não seguiu nenhum “script”. O Movimento Democracia Real desconheceu as “cúpulas” e direções sindicais. Os “políticos tradicionais” também foram atropelados pela ânsia de mudanças.

A proibição por parte do Supremo Tribunal das manifestações nos dias 21 e 22[véspera e data das eleições municipais] só demonstra a insensibilidade do Estabilshment. Os protestos se reproduziram de forma ainda mais massiva.

O resultado da eleição foi custoso para Zapatero. Uma derrota histórica. Os socialistas perderam em toda a Espanha. Após 32 anos, o Partido Socialista perdeu o governo de Barcelona. Os resultados de Bildu- coalizão da esquerda independentista no País Basco- afirmam que não é uma derrota de toda a “esquerda”. Quem sai derrotada é a fração majoritária da esquerda, que há muito aderiu ao social-liberalismo. O elevado número de votos nulos e brancos também é um sinal nesta direção. A lição das urnas, em que pese a vitória dos conservadores como produto do desgaste do PSOE, só confirma o que dizem as praças: o que se vive na Espanha é um simulacro de democracia.

 

O recurso à insurreição

O difícil quadro político poderia levar ao ceticismo? As praças da Espanha afirmam o contrário. Além de resistir contra as medidas de austeridade e rejeitar esta democracia, o movimento 15-M recorre a um velho método: o da mobilização. Um velho método, aliás, sempre reinventado, de forma criativa e crítica. O dia 15-M restituiu o próprio sentido da política na vida espanhola. Contra aqueles que acusam o movimento de ser “apolítico” vale ressaltar que ali, na praça, em sete dias, se fez uma política concentrada. Uma política que acelerou os tempos históricos. Nada da monotonia dos acordos parlamentares, dos bastidores sindicais, da corrupção legal ou ilegal do Estado. A política na sua forma plena, com conteúdo democrático, a decisão oriunda da coletividade, da Assembleia, da barricada. O “SOL” da praça de Madrid é mais do que uma metáfora. O conteúdo da ideia de “democracia real” é uma demanda atual. Necessária. Como ilustrou bem Atílio Boron, comparando o 15-M com a Comuna de Paris:

“Basta ver os documentos dos “indignados” de hoje para comprovar a assombrosas atualidade com as demandas dos comunardos e o pouco, muito pouco que mudou da política do capitalismo. Os jovens e os nem tão jovens que lotam umas 150 praças na Espanha não são “apolíticos” ou “antipolíticos” como certos setores da imprensa querem fazer crer, são gente profundamente politizada que se levam a sério na promessa da democracia e que, por isso mesmo, se rebelam contra a falsa democracia surgida das entranhas do franquismo e consagrada no tão aplaudido Pacto de Moncloa, exibido como um ato exemplar de engenharia política democrática”.

E não apenas a distante Comuna que ressurge nas praças e nos criativos cartazes do 15-M. Também as manifestações do movimento antiglobalização que tiveram lugar na virada do século e as grandes rebeliões da América Latina do mesmo período. A nova geração se une aos antigos lutadores, dando lugar a uma linda confraternização.

Tudo na praça é discutido. O clima de democracia direta e participação ativa é diretamente oposto ao que criticam no modelo oficial. Todas as tardes uma nova assembleia discute os próximos passos, conectando-se com os outros acampados do país. As equipes artísticas garantem apresentação de peças de teatros, exposição de cartazes, debates culturais, exibição de vídeos.

 O programa de reivindicações também é discutido: vai desde a taxação das grandes empresas até a incorporação de demandas como habitação, educação, emprego. Um ponto importante é a defesa que o movimento assume dos jovens e trabalhadores imigrantes. Fica claro que “Democracia Real” é bem mais do que um slogan. É um conceito, em construção, que define o “novo”, o que está nascendo nas esquinas da Espanha. A força inventiva da coletividade oferece um projeto para salvar a Espanha do caos dos banqueiros e da UE.

 

Às portas de um novo 1968?

Os desdobramentos do “Maio Espanhol” ainda são imprevísiveis. O fato é que a Espanha entrou de vez numa dinâmica de protestos e mobilização social, a partir do 15-M. Porém, quais passos, quais limites?

O que assistimos nos últimos anos nos países onde aconteceram importantes processo de luta contra planos de ajuste e retirada de direitos foi o desgaste dos governos de turno e sua substituição pela via mais “crível” da oposição. O pêndulo oscila na hegemonia da sociedade e a insatisfação acaba canalizada pela “alternância” eleitoral. Sai o PSOE entra o partido conservador, a alternativa na França de Sarkozy são os Socialistas. Ou seja, uma dinâmica que não consegue superar os limites da luta defensiva e acaba se dispersando no terreno da luta política.

A referência a outro “Maio”, o de 68, é fundamental. O “ano das revoluções” foi um marco por conta da singularidade do processo: massivo, combinado e profundo. Massivo porque milhões em todos os continentes, de forma mais ou menos espontanea, mais ou menos sincronizada saíram às ruas para contestar o poder vigente. Combinado porque convergiram inúmeras lutas, desde a luta por um “socialismo com rosto humano” na Primavera de Praga, a luta dentro dos Estados Unidos contra a guerra, nos países latino-americanos, chegando ao questionamento do regime francês, uma democracia européia desenvolvida. E profundo, pois chegou a colocar em xeque o governo, inaguarando a inédita hipótese de crise revolucionária na França.

O movimento atual está longe deste patamar. Contudo, o “fantasma” de 1968 ronda a Puerta del Sol. Uma definição mais cautelosa poderia afirmar que estamos num movimento cuja força potencial está no meio do caminho entre o movimento antiglobalização [iniciado em Seattle em 99] e as lutas de 1968. Mais perto de Seattle do que do maio francês.

O que esperar do futuro imediato destes novos processos?  Três fatores nos ajudam a pensar o que pode vir pela frente: a linha do BCE (Banco Central Europeu) tem sido errática para enfrentar a crise da dívida; o fato de que não existe nenhum sinal de recuperação da economia na Europa- a OCDE prevê que a Espanha vai demorar 15 anos para voltar a ter taxas de desemprego idênticas ao período anterior a crise; e por fim, o fator determinante: a capacidade de resistência social aos planos de austeridade.

 Não sabemos o que pode passar. Novas manifestações estão convocadas. A tarefa é ampliar e estender os protestos. Ampliar para os trabalhadores e desempregados. Para os Imigrantes. Das praças da Espanha para as praças de toda a Europa. E conectar. Conectar-se com as revoluções árabes, com o exemplo islandês, com a resistência nos outros cantos do mundo. O futuro imediato do 15-M depende da força das mobilizações nos países onde a crise social se encontra em estágios avançados.

 A Grécia é o grande vulcão que pode entrar em erupção e dar o esperado “salto de qualidade”. No dia 25 de Maio, dezenas de milhares de pessoas cercaram o parlamento grego. Uma bandeira gigante da Espanha abriu a manifestação: “Estamos despiertos, ya es hora que se vayan”

Nas manifestações gregas de 08/09 uma faixa se destacou. Seus dizeres “Povos da Europa, Levantem-se”.

Nas manifestações em Madrid e Barcelona outra faixa chamou a atenção. “Neste verão… te convidamos a virar do Avesso o mundo”.

Da resposta a este chamado depende o futuro.

 

 


[1] A “Puerta del Sol”  fica no centro de Madrid e é o quilometro zero de todas as estradas espanholas.

Israel Dutra, sociólogo e membro da direção nacional do PSOL

Crise burguesa e despertar político na Europa

05/06/2011

Por Pedro Fuentes, Secretário de Relações Internacionais do PSOL

  Dois processos de signo oposto compõem a situação política da Europa. De um lado há uma quebra do projeto econômico e político construído pelas classes dominantes na União Européia (UE). Basta ler os jornais para perceber como o otimismo que reinou nas duas primeiras décadas de existência da EU (os anos 80 e 90), deu passos em direção ao ceticismo cada vez maior sobre o presente e o futuro incerto de seu projeto. Os fatos mais preocupantes são o estancamento econômico global e a crise aguda de alguns de seus países-membro (Espanha, Grécia, Irlanda, Portugal, Islândia). De outro lado, um despertar do movimento de massas. Contagiados pela revolução árabe, os jovens espanhóis tomaram as ruas e praças com um novo movimento político, que em certo sentido nos lembra o Maio francês. A Espanha bate péssimos recordes, e atinge 20% de desemprego.  Por sua vez, o movimento de massas na Grécia se radicalizou e a última greve geral exemplifica. O continente com mais tradução de lutas dos trabalhadores despertou, abrindo uma nova vaga na luta de classes do continente.

 

 Um projeto em crise

 

 A UE foi um sério e ambicioso projeto do imperialismo europeu para fortalecer suas burguesias no período Reaganiano de ofensiva neoliberal. Talvez o mais importante projeto do imperialismo europeu em meio século. A idéia de uma nova ordem mundial estável, criada a partir da queda do “socialismo real”, tem como UE como peça chave. O projeto teve seu momento de esplendor com a queda do Muro de Berlim. Avançou com a incorporação de praticamente todos os países do Leste, relançando o capitalismo em economias como a Polônia, e outros países orientais que apresentavam a vantagem da mão de obra barata. Essa unidade, porém, significou a precarização do trabalho em diversos países, e a criação de um vasto exército de reserva, engrossado pelas fileiras imigrantes da América Latina e especialmente da África e da Ásia. A unidade interna da Alemanha, o centro da unidade européia, permitiu ao imperialismo arruinar com as conquistas históricas da classe trabalhadora alemã, os melhores salários da Europa. Permitiu também que o conjunto da burguesia imperialista avançasse sobre leis e conquistas sociais em geral. Logrou-se assim o fortalecimento do Euro, a criação de várias instituições continentais capitalistas, como o Banco Central e o Parlamento Europeus. Sua maior dificuldade foi construir instituições de poder supra estatal. O triunfo do NÃO à Nova Constituição da Europa na França, que impediu a sua implementação, foi uma derrota importante na consolidação da UE enquanto projeto imperialista. Foi sua primeira advertência de crise, que agora estourou como conseqüência da crise mundial aberta em 2007.

 

A Europa se “latino-americaniza”

 

  Sem dúvida, a União Européia está sentindo como nenhum outro continente a crise mundial aberta em 2007. Está passando algo tão similar ao que ocorreu com a América Latina nos anos 90. Lembremos o que foi a ofensiva neoliberal, de privatizações, de leoninos planos de ajustes ditados pelo FMI, que estrangularam as economias de muitos países. Ao fim da década, começou na América do Sul um amplo processo de insurreições e revoluções que se estenderam aos primeiros anos do século XXI. Bolívia, Equador, Venezuela e Argentina atravessaram distintos processos de mobilizações que alteraram a correlação de forças destes países. As revoluções bolivarianas lograram barrar o projeto da ALCA, e essa virada na correlação de forças fez surgir países politicamente independentes dos EUA.

            Respeitando o fato de que nada é igual, e por isso toda analogia pode se tornar equivocada, o que ocorre no velho continente são traços similares ao que passou na América Latina. O que fez o FMI em nosso continente é o que está fazendo agora, junto com os bancos alemães e franceses, com os países endividados da Europa. Os empréstimos às economias mais endividadas e a beira da bancarrota (Espanha, Portugal, Grécia, Islândia, Irlanda), se fizeram ao invés de se aplicar os piores planos de auteridade fiscal que sofreu nosso continente. O economista keynesiano Paul Krugman, em seu excelente artigo do New York Times (presente neste Boletim de junho da Secretaria de Relações Internacionais do PSOL) descreve perfeitamente a situação: “os líderes europeus ofereceram empréstimos de emergência para as nações em crise, mas em troca de promessas de que seriam implementados programas de austeridade cruéis, que consistiam principalmente de enormes cortes de despesas”. E nós acrescentamos: cortes de salários e aumento da idade das aposentadorias. Krugman pontua que há “um novo declínio econômico graças aos programas de austeridade implementados, e a confiança está naufragando, em vez de aumentar. É evidente, agora que Grécia, Irlanda e Portugal e não podem e não se dispõem a resgatar suas dívidas”.

            Ou seja, estes programas não só impõem efeitos sociais perversos ao povo, como também agrava a crise econômica do capitalismo. É um custo muito alto resgatar os países quebrados co alto índice de desemprego.  Sob estas condições, é impossível a recuperação econômica, o que abre a hipótese de crise similar a da Argentina em 2001, desvatar Portugal, Espanha e Grécia.

 

O despertar: início de um novo tempo político

 

            A ofensiva contra os trabalhadores, em particular os trabalhadores imigrantes, a mais barata mão de obra, está se ampliando. A classe trabalhadora européia, a mais organizada do mundo, está resistindo como pode. Sofreu cortes importantes em seus direitos trabalhistas, mas nunca foi plenamente derrotada. As organizações tradicionais dos sindicatos mantêm vivas as lutas defensivas. Conseguiram amenizar os panos de cortes clássicos que se tentam implementar, no continente de mais altos salários do mundo. As direções sindicais lograram negociar com os governos para que as reformas do FMI sejam menos austeras. Os partidos social-democratas e os velhos PC’s, bastante assimilados ao regime, se alternam no poder com os partidos da direita tradicionais, para levar adiante os planos de ajustes.

Entretanto, essa situação de um relativo status quo estável começou a mudar. Cresceram os protestos, as greves gerais na Itália, França, Inglaterra, as mobilizações estudantis de massas. A Islândia, país de pescadores que foi convertido em uma roleta financeira (ver artigos sobre a Islândia neste Boletim de junho da Secretaria de Relações Internacionais do PSOL), foi a primeira advertência de um novo tempo político. Com um “cacerolazo” e dois referendos populares, o povo disse não ao pagamento da dívida aos banqueiros. Sem embargo, o novo momento se fez mais evidente com a revolução árabe que contagiou a juventude espanhola. Neste país apareceu uma nova forma de protesto auto-organizado, com reivindicações muito mais políticas, superando o caráter defensivo e questionando os partidos e velhas direções sindicais, levantando demandas por outra democracia, denunciando o regime com consignas anticapitalistas.

As praças da Espanha poderiam ser um fenômeno conjuntural, de alguns dias de duração. Mas tudo indica que não é. Apesar do movimento não apresentar a massividade das revoluções árabes e seja mais de uma vanguarda jovem, impactaram as massas e tendem a se transformar em assembléias populares ao estilo da Argentina em 2001. É a expressão mais avançada de uma nova etapa que se abriu na Europa, com centro na Espanha e na Grécia, mas que tende a repercutir em outros países. A conexão dos movimentos na Espanha com o processo mais profundo da revolução árabe gera sua permanência.

 

O papel da juventude

            A semelhança com o Maio francês é, sobretudo, pelo papel da juventude, que compõe a vanguarda e lhe imprime um caráter espontâneo, contestatório, de auto-organização. A crise de consciência socialista (que permanece viva) faz com que seu programa seja menos avançado que o Maio francês, pois os jovens espanhóis questionam o regime, mais do que o sistema. Suas propostas são democráticas radicais, co elementos anticapitalistas. E uma das características comuns das novas mobilizações é o papel da vanguarda e a criatividade da juventude. A juventude o setor mais sensível das sociedades e por isso os jovens europeus percebem que a crise é global, e a responsabilidade da crise é dos políticos e dos banqueiros. Essa juventude contempla um amplo contingente de explorados e desempregados. A juventude é o novo sujeito dinâmico da luta de classes européia. 

A Europa é o continente palco das maiores batalhas da luta de classes na história: as revoluções operárias de 1848, a Comuna de Paris em 1870, a Revolução Russa de 1917 e suas revoluções correlatas na Europa, o Maio francês em 1968, a Revolução dos Cravos em 1974. Passou pelos mais avassaladores regimes contrarrevolucionários da história: o nazismo, o fascismo, fundamentais para sua derrota na II Guerra Mundial. Talvez possamos dizer que, dentro de poucos meses, Grécia e Espanha vivam situação pré revolucionárias. Se assim for, não haverá dúvidas de que, junto com as revoluções democráticas árabes, a Europa começará um novo tempo da luta de classes mundial.

As praças exigem mudanças sociais, as urnas refletem um giro à direita

02/06/2011

Por Partido Obrero Revolucionario da España

Dois processos estão misturados nas eleições de maio: a mobilização de milhares de jovens indignados com a crise econômica e com a falta de futuro que a atual sociedade lhes oferece e o voto em urna no dia 22. O resultado de ambos é bastante contraditório.

 

Milhares de jovens ocuparam as praças de muitas cidades desde o domingo, 15 de maio. Com seus protestos não fizeram mais que expressar o sentimento geral no país: que a crise está sendo paga pela classe trabalhadora, que os banqueiros e os grandes empresários seguem acumulando benefícios; que os dirigentes políticos são incapazes de tomar medidas contra os mais ricos, e que, na realidade, são mais seus lacaios que representantes do povo; que a corrupção e os corruptos seguem  no comando das instituições; que a democracia é muito insuficiente, que é necessário mudar essa sociedade para que as coisas funcionem melhor, para acabar com o fato de que alguns poucos decidam a economia e a política em função de seus interesses particulares e não dos interesses da maioria. Essa foi a mensagem transmitida – e que segue sendo repetida – pelos jovens indignados desse país.

 

Mas as urnas disseram coisa bem diferente. O voto da população outorgou uma maioria esmagadora ao Partido Popular (PP), partido dos ricos e empresários, contrários aos servições públicos, partidários da privatização, dos que se movimentam contra os imigrantes, que retiram direitos e liberdades. De qualquer ângulo que se olhe, a direita venceu as eleições. A maioria da população decidiu dar seu apoio para o partido dos ricos.

Não é que o discurso da direita convença. É que a esquerda neoliberal decepcionou. Ambos os processos, o das praças e o das urnas, têm uma origem comum: o rechaço às políticas do governo Zapatero. Provavelmente, muitos dos milhares de jovens que estão se mobilizando para exigir um mundo melhor são os que participaram das manifestações contra a guerra do Iraque na qual o governo anterior, chefiado pelo PP e com o apoio de Zapatero, nos enfiou.

Há tempos que o PSOE havia perdido crédito, portanto. Especialmente, desde que, frente à brutal crise capitalista, Zapatero decidiu implantar as decisões que impuseram os chamados “mercados”, ou seja, os banqueiros e as multinacionais, e que nos levaram à situalção atual: 5 milhões de desempregados, precariedade no mundo do trabalho, corte na previdência e ampliação da idade de aposentadoria, reformas trabalhistas a favor dos empresário e etc.

   Essa política neoliberal também foi mal recebida entre os trabalhadores.

Não é possível afirmar que algúem é de esquerda se ele aplica políticas de direita.  E foi a servidão frente a essa situação que deu espaço para o fortalecimento da direita. O fracasso das políticas de Zapatero é a base da vitória do PP. O partido dos ricos não venceu por suas propostas, mas pelo fracasso do PSOE. As políticas da direita, como já está demonstrando CIU na Catalunha ou Esperanza Aguirre em Madrid, serão novos ataques aos direitos públicos, à saúde e à educação pública para favorecer os capitalistas. É isso que representa a vitória do PP.

 

 Esquerda Unida, avanço positivo, porém insuficiente

 

A Esquerda Unida avançou, mas ainda é frágil, comparado ao que representou a derrota do PSOE. No conjunto das eleições, somou 18.153 votos a mais e um aumento da bancada em quatro deputados (Há 3 mais em Aragón,  1  na Castilla  y  León,  3  em  Extremadura,  2  em  Madrid e  1  em  Navarra,  mas perdeu  4  en Baleares e 2 no País Valenciano).

 

Enquanto nas eleições municipais, somou 190.829 votos a mais que em 2007 e passou a ter 2.628 conselheiros (antes, eram apenas 2.485). Além disso, obtiveram 58 prefeituras com maioria absoluta e 53 com maioria relativa, ainda que tenham perdido Córdoba.

 

Na situação de crise, como a atual, com o declínio eleitoral do PSOE, com um setor da juventude mobilizada nas praças da Espanha, temos que levar em conta esse avaço como base para gerar uma alternativa mais ampla, mais colada nas exigências do povo trabalhador e da juventude.

 

A esquerda social e política está numa situação da qual é difícil sair com sua bagagem atual. É o momento de reforçar a luta pela refundação/renovação do conjunto da esquerda. É hora de realizar um amplo esforço para reconstruir a esquerda sobre novas bases.

Não se trata de defender aquilo que já faremos: evitar que as prefeituras caiam nas mãos do PP e da direita. Tampouco se trata de simplesmente ter contato com movimentos e atores sociais e defender algumas de suas propostas. Trata-se de organizar, lançar um processo constituinte, que convide a criar algo novo e que usemos nossa força institucional obtida e nossas assembléias como instrumentos fundamentais, a serviço desse processo que regenere a esquerda.

 

Os acampamentos nas praças serviram, na campanha, para que muita gente fale de política e foi – e vai seguir sendo – uma referência. Inevitavelmente, uma parte desse processo de reorganização que clamamos deve passar pelos acampamentos.

Devemos propor, com prudência, com educação, com modéstia, mas com determinação que esse descontentamento se conecte com a política e a alimente massivamente – ainda que já saibamos que não o fará exclusivamente – as veias das principais entidades sindicais, associativas.

Assim, o vulcão lançará sua energia a favor da renovação da esquerda e não só ao ar. Isso significa que se trata de lutar conscientemente para que convirjam dois os dois processos: o da esquerda consequente e o processo de evolução política, de coordenação e elaboração de novas idéias, propostas e formas democráticas de fazer com que a política do movimento dos acampados se misture e conflua em um novo marco político e de organização da esquerda.

 

Por sua importância política, faremos menção especial ao resultado de Bildu. Primeiro proibiram Sortu, logo, tentaram com Bildu. Aí estão os resultados. Segunda força política em Euskadi, primeira em São Sebastião, o partido com mais conselheiros, 74 prefeituras e 22 maiorias simples. O processo para obter uma solução democrática em Euskadi passa pelo reconhecimento pleno e pela legalização do independentismo Basco.

 

As eleições em Madri

Sendo Sol e seus acampados uma referência em todo o território, o panorama eleitoral de Madrid foi a expressão viva da desconexão entre a esquerda política e essa parcela da população que, simbolizada na praça, quer dar um giro à esquerda e sai às ruas. Dos  2.287  conselheiros e 179 prefeitos em jogo, o PP obteve 1.188 (+118) conselheiros e  106 prefeituras onde são maioria absoluta e 38 onde são maioria simples. Por sua vez, o PSM-PSOE obteve os piores resultados da história, 725.306 votos e 539 conselheiros (‐125). IU que aumentou em quase 66 mil votos, alcançou 175 cadeiras de conselheiros (+46) e manteve seus principais bastiões (Rivas y San Fernando). Apesar disso, ainda está longe de recuperar os mais de 200 mil votos perdidos pelos socialistas. Por fim, UPD obteve 64 cadeiras de conselheiros e cerca de 200 mil votos.

Vitória eleitoral do neofranquismo (PP)

O panorama na assembléia de Madrid não é melhor, ao contrário. O PP teve maioria em 5 deputados e, com isso, terá 67, numa câmara de 129. O PSOE passa de 42 a 36. IU sobe de 11 a 13 e UPD irrompe com força passando de 0 a 8.

Aos demolidores dados eleitorais da esquerda na assembléia e na Comunidade, temos que somar seu significado, a perda da imensa maioria de importantes bastiões que eram uma certa barreira de contenção ante o neoliberalismo extremo e mantinham uma base populacional impotante no campo da esquerda, o chamado Cinturão Vermelho. Hoje, simplesmente, esse cinturão já não existe.

 

Na Catalunha

Catalunha apresenta alguns traços diferentes. O PSC perde, pela primeira vez, uma eleição municipal (778.042 votos para CiU x 721.443 votos para PSC). Diferentemente do resto do estado, a esquerda soma mais votos que a direita (PSC+ICV‐EUiA+ERC+CUP+CAV  somam 1.220.925 votos e CIU, PP, C’S i PxC somam 1.176.709 votos). 

Apesar da maré conservadora, houve mais votos na esquerda, especialmente na área metropolitana. A esquerda perdeu 399.614 votos em relação às eleições municipais anteriores, dentre os quais, uns 250 mil foram canalizados para a abstenção.

A direita somou a mais em relação à eleição de quatro anos atrás, mas perdeu 511.147 em relação às eleições de seis meses atrás. É especialmente relevante que a CiU perdeu 419.968 votos, o PP 20.464, Ciudadanos 70.715 e PxC 9.416. Por outro lado, o PSC recuperou  151.082  votos,  ERC  39.518,  ICV‐EUiA 11.933. Somados, são 202.533 votos.

Consolida-se o giro à direita repesentada majoritariamente pelo CiU, basicamente pela perda de Barcelona e cidades como Mataró,  Igualada,  Vilanova,  Vilafanca, Manres.

O PP sobe 80.000 e mais 200 conselheiros. Obteve maioria em Badalona, a terceira maior cidade da Catalunha, com uma campanha nitidamente xenófoba e racista. Será seu “as na manga” no pactos entre CiU e PP que se darão. Esse pactos suporão uma mudança profunda do mapa político catalão. Ciudadanos  foi reduzido quase à marginalidade com 1,2% dos  votos por trás da Plataforma por Catalunha (PxC) – uma organização de extrema direita, cujo ideário é contra a imigração e descaradamente racista, nos bairros onde a crise e as greves estão mais presentes – que somam 65 mil votos.

ERC sofreu um descalabrio ainda maior em relação a seu peso nos municípios. Boa parte de seu eleitorado não aceitou bem a “filiação”  de  Joan  Laporta, visto como alguém alheio aos valores progressistas. A Candidaturas de Unidade Popular (CUP), que já tinham certa consolidação em algumas bases, deram um salto importante, substituindo em algumas cidades, a ERC, como em  Girona. Seus mais de 62.000  votos  e 101  conselheiros se situam na esquerda independentista combativa, assim como as CAV, candidaturas de Vallès, que também cresceram até 15.000 votos e 16 conselheiros. Essas duas formações mostram que, num quadro de retrocesso da esquerda, há exemplos de acumulação de forças importantes para a confluência e unidade de ação na mobilização social e política.

ICV‐EUiA  atingiu resultados que a consolidam à esquerda do PSC. Aumentou em Barcelona, com uma campanha situada claramente à esquerda e contra as políticas de cortes sociais do governo de Artur  Mas.  Conseguiu manter o El  Prat e recuperou algumas localidades como Sant Feliu,  Santa Perpètua,  Montornés, Cubelles…  Não conseguiu atrair os votos que seriam destinados ao PSC, ainda… mas a campanha se situa como uma ferramenta útil a favor dos mais desfavorecidos e das camadas populares.

Agora começa o momento decisivo dos pactos. É o momento de consolidar governos com programas de esquerda e fechar o cerco para a direita. Chegar a acordos com CiU sempre deu alguns resultados nefastos. É decisivo tornar úteis e coerentes os votos da cidadania. Isso tem que ser notado nas políticas municipais.

No dia 14 de maio, mais de 200 organizações, com CCOO e UGT na vanguarda, levaram mais de 200 mil pessoas às ruas, contra os cortes orçamentários na saúde, educação e serviços sociais… são o reflexo de dezenas de pequenas lutas diárias.

No dia 15 de maio, mais de 15 mil manifestantes em Barcelona, convocados pelo “Democracia Real Já!” iniciam, junto a dezenas de cidades, os acampamentos que se multiplicam.

O descrédito da política profissional, a crise provocada pelo capitalismo, a necessidade de serem protagonistas do futuro atingiram dezenas de milhares de pessoas em todo o estado…  e provocaram uma espetacular atenção da mídia. Como teriam sido as eleições sem essas mobilizações? Sem dúvida, pior para a esquerda. É certo que o “tsunami” que que se supunha encontrar nas eleições ao parlamento era difícil de superar em apenas seis meses. Mas as lutas começaram a por em dúvida a legitimidade da CiU para seguir com seus ataques aos direitos sociais e suas políticas de benefício para as empresas e as grandes fortunas.

 

Em Euskadi

O mapa político no país Basco mudou radicalmente. A diferença do resto do estado foi Bildu, a confluência de diversas tendências do nacionalismo de esquerda Basco, que obteve o avanço mais espetacular. 25% dos votantes lhes deram seu apoio. Em 74 povoados, obtiveram maioria absoluta. É o primeiro partido na provincia de Guipúzcoa e na cidade de San Sebastián. Toma um novo impulso a luta por paz, pelo direito de decidir dos Bascos, pela legalização plena dos partidos. Ao contrário, Ezker Batua, teve um importante retrocesso. Perdeu mais de 32 mil votos e ficou com apenas 13 conselheiros.

 

 

Partido Obrero Revolucionario da España (Quarta Internacional)

25 maio 2011